quinta-feira, maio 24, 2007

Remix Ensemble (reportagem)

O Remix Ensemble, agrupamento residente da Casa da Música, dedica-se exclusivamente à música contemporânea. Reconhecido pela crítica internacional, tem feito diversas estreias mundiais, trabalhando com compositores e maestros conceituados. O sucesso do projecto passa também pelos bastidores.


Portas pretas e pesadas que se abrem para corredores largos onde não chega a luz do dia. Funcionários que arrastam caixotes cruzam-se com artistas que falam português, inglês e espanhol. É assim o piso -2, a cave dos ensaios da Casa da Música.


Na sala principal, alguns músicos conversam. Os acordes do violino de Heleen Hulst e as anotações do pianista inglês Jonathan Ayerst preparam o Concerto de câmara para piano, violino e 13 instrumentos de sopro de Alban Berg.

Simon Breyer toca trompa, mas enquanto não começa o ensaio, diverte-se a experimentar os estranhos instrumentos da percussão. Estranhos porque são recentes na composição da música erudita. São contemporâneos, tal como as obras que o Remix Ensemble interpreta.

Na música contemporânea explora-se o nunca antes experimentado. “Consigo tirar mais do que pensava ser possível, ir mais longe do que os limites”, diz Stephanie Wagner, flautista do Remix há três anos. Natural de Lisboa, emigrou para a Alemanha em busca de melhores oportunidades no mundo da música. Mas foi cá que, curiosamente, encontrou emprego. Continua a viver na Alemanha, mas regressa todos os meses para trabalhar no Remix, mais pelo ambiente de amizade do grupo. “O que nos faz especiais é a amizade que temos; é um grupo muito unido e isso faz a diferença. Uma coisa especial que não se pode comprar e que não existe numa orquestra nem noutros grupos.” Até porque numa orquestra há mais distância entre as pessoas: “é um grupo enorme e isso cria mais concorrência, rivalidade”, acrescenta.

“OK!”, diz o maestro alemão Peter Rundel e o silêncio torna-se absoluto. O Concerto de Câmara de Alban Berg abre com um solo de piano, seguido pelo violino. Depois entram os 13 instrumentos de sopro. Sons aparentemente descoordenados que não penetram facilmente no ouvido, mas não deixam indiferente o espectador mais distraído.

Jonathan desliza os dedos nas teclas com suavidade, não obstante a pujança do som. A naturalidade da sua execução dá a ideia de que é fácil reproduzir os desenhos assustadores da partitura. Pianista do Remix desde a sua fundação, Jonathan Ayerst elege “o alto nível dos músicos e a variedade do repertório” como “as melhores coisas” do grupo.

O pianíssimo é interrompido pelo fortíssimo de todo o Ensemble. Cada segundo é uma surpresa. Quando se espera um abrandar do ritmo ou da intensidade, eis que irrompe uma tempestade de sons atordoadores, estudados matematicamente. Nenhuma nota vem do acaso, apesar da aparente desordem.

O que Berg quis dizer quando fez calar o piano no momento em que entrava o violino? Segundo a explicação do programa assinada por Paulo Assis, o Concerto de Câmara (Kammerkonzert), “assinala um ponto de viragem da maior importância na obra de Alban Berg”, que se apresenta como “alguém que tudo revela sem nada revelar”.


O efeito das surdinas dos metais, os bouchés (sons fechados) e os cuivrés (sons abertos) das trompas, o vibrato da flauta, os glissandos do trombone. As notas agudíssimas do flautim, a bravura da requinta, a potência dos baixos do contra-fagote…

Peter Rundel dirige o ensaio sentado numa cadeira alta, pousada num estrado. Todos os músicos têm de ver e ser vistos pelo maestro. Um olho na partitura, outro no maestro. A direcção musical determina não só a interpretação da obra mas também o rumo do concerto, ao vivo e em directo, onde nada é exactamente igual aos ensaios.

Todos são solistas, não há papéis secundários. Apesar do potencial profissional de cada músico, André Quelhas, gestor do grupo, diz que “o Remix é mais do que a soma das suas individualidades” e o facto de estar “em constante crescimento e expansão, não tem dado para ninguém se acomodar”.


“Very good!”, diz Peter Rundel, quando o eco deixado pelos últimos acordes se desvanece no ar. Os músicos agradecem com um tímido aplauso. “Time for break!” é a frase do maestro que anuncia o intervalo.

A segunda parte do ensaio destina-se a trabalhar a interpretação. Peter Rundel interrompe várias vezes a execução para dar indicações. Não fala português, apenas inglês e, esporadicamente, alemão, a sua língua natal. Explica a José Fernando Silva, o oboista principal: “Tenta entrar no espírito do compositor! Tenta ser tu o compositor!”. “Penso que podes ser um bocadinho mais expressivo”, diz ao clarinetista Ricardo Alves. “More charm!!!”, acrescenta Rundel a sorrir.

O nível da execução não tira espaço a momentos de descontracção, troca de piadas e gargalhadas. Feitas as correcções, o ensaio termina com um simpático “Thank you!” de Peter Rundel. Desmontam-se os instrumentos, fecham-se os estojos. Até ao dia seguinte.

Sandra Bastos
Janeiro 2007
Reportagem para a disciplina de Complementos de Jornalismo

1 comentário:

Anónimo disse...

Ola Amiga cm estas?
Esta mt bem a noticia!!!!! gostei adorei.....

Beijocas